O Gás Natural é um assunto que já está em alta há algum tempo no setor energético, em especial nos últimos meses com a aprovação da Nova Lei do Gás (março – Lei nº 14.134, de 2021). Ainda mais recente, no começo de junho, foi publicado o Decreto nº 10.712 que regulamenta essa Lei e trouxe satisfação para muitos profissionais desse setor.
Para entender melhor sobre o assunto, a Full Energy entrevistou três nomes do mercado energético para melhor explicarem a importância do Gás Natural e os próximos passos do mercado a partir da Nova Lei.
Symone Araújo, diretora da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), diz que o gás natural é por excelência o combustível da transição para matrizes energéticas mais limpas.
“Nesse contexto, o crescimento da participação do gás na matriz energética do Brasil – que apresenta elevada participação de fontes renováveis – traz importante complementariedade à geração energética nacional, sendo fundamental para garantir continuidade do suprimento de energia principalmente nos períodos em que, por exemplo, há menos chuvas ou ventos”, explica Symone.
O CEO da EnP (Energy Plataform), Márcio Félix, também acrescenta que o uso do Gás Natural desempenha uma função estratégica e fundamental na substituição de combustíveis com maiores pegadas de carbono e no aumento da competitividade industrial.
Felix sinaliza que o momento que a indústria de óleo e gás vive no Brasil é único. “Existem grandes oportunidades de aproveitar a indústria do gás natural no Brasil. O mercado futuro será muito mais aberto, diversificado e competitivo. Atores que já atuam no Brasil poderão exercer outras funções e novos players entrarão ou surgirão no mercado. A oferta tem a perspectiva de crescimento e diversificação da fonte de fornecedores.”
Já Heloísa Borges, diretora de estudos do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis da Empresa de Pesquisa Energética da EPE (Empresa de Pesquisa Energética), pontua que o mercado brasileiro de gás natural está atualmente em um ponto de virada.
“Diversos novos agentes obtiveram autorizações e se preparam para atuar no setor, enquanto novos projetos de exploração e produção – além de projetos que foram objeto de desinvestimento e serão revitalizados – possuem expectativa para iniciar suas atividades nos próximos anos. A indústria está se organizando para alavancar a retomada econômica após a crise da Covid-19, e o gás natural pode ser um dos principais combustíveis nesta recuperação.”
A diretora da ANP também acredita que, com a regulamentação da Nova Lei do Gás, espera-se que o mercado nacional de gás natural continue seu caminho rumo à maior liquidez dos mercados, com um número maior de compradores e vendedores.
Ela diz que alguns sinais dessa continuidade já são perceptíveis, seja pelo maior volume de autorizações de carregamento outorgadas ou pela realização de sucessivas chamadas públicas para contratação de capacidade nos gasodutos de transporte.
Os pontos fundamentais para um aprimoramento do mercado de gás natural brasileiro a serem buscados na regulação são:
1) Viabilização do acesso de terceiros ao sistema de transporte e às instalações essenciais, com ganho de eficiência na utilização da infraestrutura e consequente redução dos custos;
2) Redução da participação da Petrobras na comercialização de gás natural e aumento da oferta de gás ao mercado por terceiros;
3) Adoção de um regime de entrada e saída no transporte, com contratos padronizados e produtos agrupados que facilitem a movimentação de gás entre as diferentes transportadoras;
4) Comercialização em Ponto Virtual de Negociação, de modo a permitir que os carregadores compensem desequilíbrios entre seus portfólios de oferta e as demandas contratadas pela via do mercado competitivo.
Na visão de Felix, a Nova Lei do Gás introduz instrumentos capazes de mitigar gargalos até então inerentes ao desenvolvimento da indústria do gás natural, a exemplo ao acesso às infraestruturas essenciais por agentes do mercado e das dificuldades encontradas na expansão das infraestruturas necessárias para disponibilização da molécula aos consumidores.
“Desta maneira, a Lei desponta como uma chance de levar mais competitividade ao mercado e aponta para uma oportunidade de criar condições para redução dos preços atuais em decorrência do aumento da oferta para os próximos anos”, ressalta Félix.
Heloísa destaca o Plano Indicativo de Gasodutos de Transporte (PIG), estudo que a EPE desenvolveu sobre assunto. “O PIG trata da expansão da malha de transporte de gás nacional, enquanto o Plano Indicativo de Processamento e Escoamento de Gás Natural (PIPE) trata de UPGNs e gasodutos de escoamento, e o Plano Indicativo de Terminais de GNL (PITER) trata sobre terminais de regaseificação de GNL no País, possivelmente abordando terminais de liquefação no futuro. No caso do PIG, já foram estudados 6.380 km de gasodutos de transporte nas duas edições publicadas do Plano, que somam cerca de 60 bilhões de reais em investimentos que podem ser implementados pelos agentes nos próximos anos. Já no PIPE, foram estudados 11 projetos somando cerca de 40 bilhões de reais em investimentos e incluindo 2.100 km de gasodutos de escoamento, tanto no Pré-Sal quanto no Pós-Sal brasileiros. A primeira edição do PITER será publicada este ano, com novos projetos de terminais de GNL possíveis para implementação.”
Por fim, a diretora da EPE explica que o mercado de gás natural prepara-se para abranger uma maior diversidade de agentes, com diferentes tipos de contratos e maior liquidez, movimento similar ao que ocorreu em outros países do mundo ao longo dos respectivos processos de abertura.
Ela acrescenta que, mundialmente, os mercados de gás natural se desenvolveram em um primeiro momento com contratos de longo prazo, oferta e demanda firmes, muitas vezes atrelados ao petróleo. Com o tempo, Heloísa diz que surgem contratos de médio e curto prazos, com maior diversidade de agentes, incluindo também mercados de futuros, com instrumentos financeiros.