Alexandre Honaiser, da Framatome: “Temos o compromisso com o desenvolvimento da energia nuclear no Brasil”

Alexandre Honaiser foi eleito entre os 100 Mais Influentes da Energia de 2024 na categoria Indústria

Eleito entre os 100 Mais Influentes da Energia de 2024, Alberto Alexandre Honaiser, diretor da Framatome América do Sul, traz uma história inspiradora no setor de energia.

Depois de servir à Marinha por 28 anos e atuado em diversos tipos de Navios, área de logística e de material, Alexandre deixou a Força Naval e foi convidado a se juntar ao time da Eletronuclear, onde permaneceu de 2007 a 2012, período em que teve a oportunidade de trabalhar no licenciamento de Angra 3, fazendo a interface entre a área técnica e a área de licenciamento ambiental e nuclear.

“Foram anos de intenso aprendizado que permitiram uma imersão e um adensamento nos conhecimentos sobre as peculiaridades e características das nossas Usinas do Complexo Nuclear Almirante Álvaro Alberto, e das normas de nossa CNEN (Comissão Nacional de Energia Nuclear)”, afirma Alexandre.

Em 2012, Alexandre passou a integrar a área de desenvolvimento de negócios e parcerias internacionais do Grupo Queiroz Galvão Tecnologia em Defesa e Segurança Nacional, permanecendo na empresa até 2015. “Minha formação na Marinha como submarinista e a experiência adquirida na Eletronuclear acabaram por me auxiliar no desafio que foi integrar o esforço para a construção do primeiro submarino de propulsão nuclear da Marinha Brasileira, cujo projeto encontra-se em andamento.”

Em 10 de janeiro de 2022, Alexandre foi nomeado diretor para a América do Sul da Framatome.

Em entrevista à Full Energy, Alexandre pontua os principais destaques da empresa nesse último ano e a sua visão para o futuro da energia nuclear globalmente e o papel do Brasil nesse contexto.

  • Quais foram seus principais desafios à frente da Framatome em 2024?

Atualmente, estamos construindo duas novas usinas nucleares na Inglaterra e na França, e temos contratos para os próximos anos de mais seis usinas na França e mais duas na Inglaterra.

No Brasil, a Framatome LTDA alterou seu perfil comercial, deixando de atuar como um Escritório de Representação e Serviços, e passou a desenvolver suas atividades de forma mais independente. Isso nos dá mais autonomia, mas traz consigo novos desafios tanto comerciais, quanto técnicos. Neste sentido, estamos desenvolvendo um setor próprio de engenharia e capacitando nosso pessoal técnico que trabalha na Planta Nuclear de Angra dos Reis e no escritório da empresa na cidade do Rio de Janeiro.

Este esforço já tem dado bons resultados. Em 2024, por exemplo, técnicos brasileiros foram contratados, pela primeira vez, para fazer manutenção em plantas Nucleares na Finlândia e na Argentina, demonstrando que o Brasil já possui mão de obra capacitada a executar tarefas de alto grau de complexidade em reatores nucleares de outras nações.

Outras áreas de atuação vêm se mostrando promissoras, dentre elas a de produção de núcleo fármacos, onde iniciamos estudos de viabilidade e estamos esperançosos de que possamos, em breve, poder fabricar no Brasil e na Argentina, deixando de importar medicamentos que são extremamente importantes para diversos tipos de tratamentos médicos.

Além disso, estamos iniciando a parada da Usina de Angra 2 para troca e recarga de 1/3 do seu combustível nuclear e a realização de manutenções programadas, onde contribuímos com a Eletronuclear e várias outras empresas envolvidas para retornar a operação com plena capacidade.

  •  Como foi o crescimento da Framatome em 2024?

Seguimos firme na nossa trajetória de crescimento de negócios e trabalhado dentro de das atribuições para a manutenção da segurança, disponibilidade e confiabilidade das usinas nucleares brasileiras e argentinas em operação. Estamos confiantes na retomada da construção de Angra 3, cujo projeto se baseia no de Angra 2, da qual a Framatome é OEM (Original Equipment Manufacturer). Este importante projeto nacional terá, em breve, a decisão governamental sobre a sua continuidade e estamos esperançosos de que o país conclua a tão esperada terceira usina do complexo Nuclear Almirante Álvaro Alberto, que vai adicionar mais energia firme e limpa ao sistema energético brasileiro. Quando concluída e em operação, Angra 3, somada a Angra 1 e Angra 2, fornecerão aproximadamente 70% da energia consumida no Estado do Rio de Janeiro.

  • Qual é a sua visão para o futuro da energia nuclear globalmente e o papel do Brasil nesse contexto?

É notório o esforço que diversos países têm feito para descarbonizar suas economias e buscar energia limpa. Neste sentido, a Energia Nuclear se mostra uma opção viável, pois não produz carbono, ocupa uma área muito pequena, não é necessário alagamento se comparado a outras fontes geradoras, para uma mesma quantidade de Megawatt-Hora produzida, além de ser capaz de prover energia firme e contínua ao sistema elétrico nacional.

Desta forma, permite complementar as fontes renováveis como a eólica e solar devido a sua natural intermitência, e contribui para que a energia hidráulica possa ser poupada, mantendo sempre uma reserva nos níveis dos reservatórios para época de poucas chuvas.

A energia nuclear é constante, e uma planta nuclear gera energia dia e noite e justamente essa estabilidade integra a chamada “energia firme”. É importante esclarecer que as nossas duas usinas nucleares operam em ciclos de 13 meses e que Angra 1 e Angra 2 juntas fornecem ao sistema elétrico nacional uma quantidade de energia equivalente ao consumo de Belo Horizonte e de Brasília.

  • Como a sua gestão se posiciona em relação à demanda crescente por fontes de energia mais limpas e sustentáveis?

A energia nuclear é uma energia limpa. Embora não seja renovável, ela apresenta uma série de características que a tornam uma opção extremamente interessante e atraente para a segurança energética do Brasil, que possui grandes reservas de urânio.

A matriz Brasileira é mais de 93% baseada em fontes limpas, o que torna o país um exemplo para o mundo. No entanto, dadas as características tropicais, e a natural vocação que o país tem para produção de alimentos, há uma competição crescente pelo uso da água, seja para a agricultura, que, segundo a Agência Nacional de Águas é a maior demanda; seja para o transporte de carga nas hidrovias ou para a geração de energia hidrelétrica.

Somado a isso, houve vários incentivos para a instalação de energias renováveis, como a eólica, a solar e a de biomassa e, a maior parcela da expansão da capacidade instalada brasileira, deu-se, justamente nessas áreas, contudo essas fontes têm natural intermitência na geração.

A energia solar não é capaz de ser produzida à noite, sem depender de baterias como acumuladores. Já as plantas eólicas não produzem se não estiver ventando. Essas características se somam as flutuações da demanda ao longo do dia e dos meses do ano, como já mencionei.

Quem tem o natural papel de regular essas flutuações é a energia hidráulica. Mesmo as Usinas termoelétricas, mais caras e mais poluentes, porém importantes para o balanceamento do sistema, não podem ser simplesmente ligadas e desligadas rapidamente. Algumas precisam de alguns dias para serem desligadas, outras de períodos da ordem de 8 horas.

A energia nuclear tem, portanto, um papel complementar e moderador do uso destas diversas fontes que, em conjunto, mantém a matriz brasileira diversificada e ecologicamente sustentável.

A Framatome é totalmente favorável à produção de energias limpas, se alinhando com as suas coirmãs sustentáveis, pois afinal são todas fontes que diminuem drasticamente a produção de gases do efeito estufa. E este é um ponto sutil, mas extremamente importante de ser dito. A energia nuclear é limpa por não emitir carbono, além de não ser hidro intensiva.  A energia de uma única pastilha de urânio enriquecido do tamanho aproximado de um chiclete com apenas 7 gramas equivale a energia de 22 caminhões tanques de óleo diesel. Então, podemos refletir na quantidade de carbono que deixa de ser descarregado na atmosfera ao se optar por uma usina nuclear, principalmente ao pensar que apenas no reator de Angra 2 tem 17,4 milhões de pastilhas dessas, cada uma tendo a energia de 22 caminhões tanques.

  • Na sua opinião, quais são os maiores desafios enfrentados pelo setor nuclear atualmente, especialmente no contexto de mudanças climáticas e transição energética?

O principal desafio do Brasil nasce no desconhecimento que nossa população tem sobre a energia nuclear. Isso se reflete na área política e transpassa diversos governos refletindo na dificuldade da estabilidade orçamentária necessária para a continuidade dos projetos novos e na modernização das plantas existentes.

Mais uma vez, ressaltamos que o desafio atual é a retomada da construção de Angra 3.

Enquanto o mundo já despertou para a energia nuclear como uma fonte paralela e complementar às energias renováveis, sendo uma alternativa à queima de combustíveis fósseis, nós, no Brasil, precisamos vencer essa inércia e essa lacuna existente entre o planejamento e a efetiva execução do que foi planejado.

É um setor que precisa de mão de obra extremamente qualificada e difícil de ser formada, e o mundo hoje tem uma demanda nuclear que está já superando a oferta de profissionais aptos a atendê-la. Estamos nos aproximando de um momento em que o Brasil pode decidir por retomar a obra, e as empresas simplesmente não tenham mais capacidade de atender por estarem envolvidas em outras demandas.

  •  Quais são as principais inovações que a sua gestão tem investido?

Atualmente, a equipe brasileira está trabalhando para levantar recursos junto à FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos) para o desenvolvimento de uma ferramenta de inteligência artificial para inspeção e análise de elementos combustíveis em reatores nucleares, comprometidos com o fortalecimento da capacidade e com a qualificação da mão de obra brasileira nesta área.

  • Quais iniciativas de inovação e pesquisa a Framatome está liderando para garantir que a energia nuclear continue competitiva e alinhada com as exigências de ESG?

Hoje, contamos com um corpo de aproximadamente 18 mil engenheiros e técnicos em diversos países e com planejamento de contratar mais 10 mil nos próximos 4 anos. A empresa vem investindo anualmente em P&D e está inovando em muitos campos para melhorar a competitividade e melhor atender nossos clientes, criando e aperfeiçoando novas soluções para manter as instalações em condições operacionais sem paralisações espúrias.

Alguns exemplos dessas inovações estão nas áreas de fluidodinâmica computacional, análise de dados, códigos inovadores, aplicações de inteligência artificial na automação e no suporte às atividades preexistentes, dentre outros.

A Framatome e a Qosmosys assinaram um memorando de entendimento (MOU) para explorar a integração das unidades de aquecimento radioisótopos (RHU) e dos geradores termoelétricos de radioisótopos (RTG) como fontes de energia inovadoras para melhorar o desempenho da ZeusX, a nave espacial da Qosmosys.

Trabalhamos também em parceria internacional com a Bruce Power, a Isogen (joint venture criada pela Kinectrics e Framatome) e a ITM Isotope Technologies Munich SE (ITM) na área de medicina nuclear, onde anunciaram que pela primeira vez, um reator nuclear comercial está produzindo lutécio-177, que é um isótopo terapêutico de vida curta usado para o teranóstico do câncer de próstata, dentre outras aplicações.

 

Clique aqui e confira a lista completa dos 100 Mais Influentes da Energia 2024 na 53ª edição da Full Energy.

Assista a cerimônia de premiação dos 100 Mais Influentes da Energia 2024 na íntegra:

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  • Full Energy encerra 2024 com premiação dos 100 Mais Influentes da Energia => clique aqui.

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