“Existe segurança energética justa?”, por Eduarda Zoghbi

Segurança energética se tornou uma das principais discussões no campo da geopolítica e, no início deste ano, o tema continuou servindo como pano de fundo em eventos internacionais como o Fórum Econômico Mundial, em Davos, e certamente seguirá na pauta das reuniões dos líderes do G20.

A guerra entre Rússia e Ucrânia provocou choques nos mercados de óleo e gás que vêm afetando todos os setores da economia, e quem mais sofre nesse processo são os consumidores. Escutando um dos meus podcasts favoritos, o “Energy Gang”, ouvi minha mentora e inspiração de carreira, Amy Jaffe, falar sobre “segurança energética justa” em meio a guerra.

Para Jaffe, especialista em política energética global e professora na Tufts University, as distribuidoras de energia nos países em desenvolvimento não estão conseguindo comprar gás no mercado internacional, e os efeitos acabam impactando fortemente o mercado nacional.

No Brasil, tanto o aumento no preço do botijão de gás, que custava R$ 69,74 em janeiro de 2020 e chegou a R$ 102,40 em janeiro de 2022, quanto dos derivados do petróleo têm afetado especialmente os consumidores de baixa renda.

Enquanto isso, a União Europeia possui recursos suficientes para estabelecer um teto de gastos com energia para beneficiar o consumidor e reduzir os impactos da pobreza energética. O desafio que Jaffe coloca para os ouvintes é refletir sobre quem paga a conta.

A Rússia é o segundo maior produtor global de gás natural e possui a maior reserva, se posicionando como líder em exportações. No dia 5 de fevereiro, a União Europeia baniu importações de petróleo e seus derivados, anunciando que, dentro de um ano reduziria suas importações de gás em dois terços, após já terem suspendido o transporte de gás através do gasoduto Nord Stream 1, ainda em 2022.

Ao passo que os europeus reduzem sua dependência no gás russo, aumenta-se a busca por gás natural liquefeito (GNL) em outros mercados. Entretanto, a expansão do mercado de GNL à curto prazo é desafiadora, pois demanda altos investimentos, infraestrutura e logística de grande porte para satisfazer a demanda crescente.

É natural nos perguntarmos o motivo dos europeus não estarem suprindo a demanda por gás com energias renováveis. Vale lembrar que, além das indústrias e geração elétrica, metade das residências utilizam gás natural para aquecimento, representando 22% do consumo total.

Considerando que a infraestrutura de redes não está bem equipada para a intermitência das fontes renováveis, os governos incentivaram a população a reduzir o consumo doméstico enquanto os preços subiam rapidamente. Como mencionado anteriormente, a maior parte dos países optou por impor um teto sobre os preços no mercado de varejo para proteger os cidadãos.

De acordo com o Fundo Monetário Internacional, essas medidas pedem maior precaução, pois o alívio dado aos consumidores se agrega a demanda de outros bens e serviços que acabam impulsionando a inflação no continente.

Alguns especialistas acreditam que, para solucionar este desafio sem prejudicar o consumidor, será necessário fortalecer a oferta de combustíveis fósseis no curto prazo para promover a transição energética no longo prazo. Apesar de controversa, países como a Alemanha sinalizam que essa talvez seja a opção mais viável a curto prazo.

Atualmente, uum terço da sua eletricidade provém do carvão mineral, aproximadamente 13,3% maior que no mesmo período no ano passado. Esse aumento no uso de carvão como energia de base leva ao crescimento das emissões de gases de efeito estufa na Alemanha, um dos principais aliados da transição energética.

A experiência europeia demonstra a importância do planejamento energético de longo prazo, alinhado à uma estratégia clara para segurança energética. Para evitar que o consumidor pague a conta pela ausência de políticas eficazes é necessário que governos incorporem ideais de sustentabilidade, segurança e acessibilidade em momentos de crise.

A transição energética justa deve estar no cerne de todas as políticas energéticas de longo prazo. Para tanto, diversificar a nossa matriz é essencial. Assim, estaremos preparados para o pior cenário e conseguiremos reduzir o impacto da volatilidade de preços nos consumidores e, especialmente, nos mais vulneráveis.

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