Os laços comerciais entre Brasil e Índia sempre sopraram bons ventos, mas, o atual momento nos mostra que essa parceria vem se mostrando cada vez mais forte.
O Brasil vem desempenhando um papel estratégico para a Índia, e o setor de Energia tem um peso fundamental nesses acordos bilaterais.
Por isso, as relações do Brasil com a Índia têm se colocado no mais alto nível de prioridade. Afinal, o crescimento econômico, científico e tecnológico indiano tem brilhado aos olhos do mundo.
A demanda por energia tende a acompanhar esse crescimento e é aí que entra a experiência da energia brasileira.
Sobre os acordos bilaterais firmados, bioenergia, mobilidade sustentável e outros assuntos relacionados ao setor de energia são respondidos pelo embaixador da Índia no Brasil, Suresh Reddy, em entrevista exclusiva à Full Energy.
1- Como você avalia a atual relação entre a Índia e o Brasil, especificamente no que tange o setor de Energia?
O Brasil é um dos nossos parceiros mais importantes da região da América Latina e Caribe. No próximo ano, vamos celebrar 75 anos de laços diplomáticos com o Brasil.
Desde 1996, todos os presidentes brasileiros visitaram a Índia para aprofundar os laços bilaterais.
Desde a visita do presidente Jair Bolsonaro à Índia, em janeiro de 2020, iniciou-se um novo capítulo para essa relação bilateral.
Realizamos diversas ações bilaterais e internacionais no que compete ao mercado de biocombustíveis, com o intercâmbio de visitas técnicas, a realização de duas edições do Brazil-India Etanol Talks e do Simpósio de Biocombustíveis na Aviação, lançamentos de grupos de trabalhos e cooperação em Bionergia, rodada de negócios entre empresas da Índia e Brasil em biocombustíveis para o setor automobilístico.
Também durante essa visita, assinamos um memorando de cooperação de óleo e gás. A Índia tem como meta misturar 10% do etanol na gasolina nesse ano e aumentar esse indicador para 20% até 2025. Estamos orgulhosos de já termos atingido a nossa meta de 2022.
Isso mostra a rapidez que a Índia tem em alcançar seus objetivos, especialmente em uma escala nunca antes conquistada.
Além disso, a Índia e o Brasil coordenam juntos), dentro do G-20, o Grupo de Clima e Energia; nos BRICs estamos no Ministério de Energia e também estamos no Fórum de Diálogo Índia-Brasil-África do Sul (IBSA), e UN High-Level Dialogue on Energy, da ONU.
2- Como você avalia as ações referentes à mobilidade sustentável de baixo carbono e os avanços que a parceria Índia-Brasil trouxeram nesse sentido?
Comparado com outros países menos populosos e menores, a Índia está entre os países que registram a mais baixa emissão de carbono per capita (1.84t.).
Temos uma relação positiva com o meio ambiente e defendemos a consciência ambiental, por isso demandamos uma equidade ambiental e somos porta-voz daqueles que não têm esse espaço.
Nesse sentido, nossa atenção quanto à mobilidade sustentável é muito pertinente.
Nosso governo tem sido agressivo no uso de etanol como combustível, tornando a e-mobilidade como norma. Nosso Ministério do Meio Ambiente reuniu-se recentemente em Stockholm e, agora, estamos trabalhando juntos para fazer as ações climáticas sustentáveis uma realidade.
3- Índia e Brasil assinaram a aliança para a promoção de bioenergia e biocombustíveis. O que a Índia espera do Brasil nesse acordo?
Durante a visita do então ministro Bento Albuquerque na Índia, em abril de 2022, ambos países reconheceram o imenso potencial de colaboração entre Brasil e Índia e como isso pode escalonar a produção e uso internacional de bioenergia e biocombustíveis sustentáveis.
Concordamos em trabalhar juntos rumo ao desenvolvimento da Aliança Índia-Brasil para Bioenergia e Biocombustível.
Assinamos também o memorando de cooperação do biocombustível e isso é muito promissor. Brasil tem 27% do etanol misturado na gasolina e o nosso governo mira aumentar essa mistura em 20% até 2025.
Sabemos que o Brasil tem uma vasta experiência e know-how em biocombustíveis e isso é o que a gente procura.
Na Índia, todos veículos a gasolina são flex e podem percorrer com 100% de etanol.
Nós estamos muito interessados na tecnologia de produção do etanol brasileiro, flex-fuel e outras ferramentas relacionadas.
A Corporação do Óleo da Índia (IOCL) e o Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) também estão trabalhando próximos nas pesquisas sobre Bioenergia.
Também tivemos uma visita da delegação da Associação Indiana de Usinas de Açúcar que estão muito interessadas no etanol brasileiro.
4 – A Índia é o quinto maior parceiro comercial do Brasil. Quais são suas perspectivas sobre essa parceria?
Durante a visita do presidente Bolsonaro à Índia, ambas nações expressaram confiança de que a meta comercial bilateral de US$ 15 bilhões poderia ser alcançada em 2022.
Apesar da Covid-19, o nosso acordo bilateral cresceu US$ 11.488 bi em 2021 em comparação com 2020. Além disso, a Índia tornou-se o quinto maior parceiro do Brasil.
O ano de 2022 também começou com um grande marco. De janeiro a maio, o acordo bilateral foi de US$ 5.283 bi, representando 21,3% de aumento comparado com mesmo período do ano passado.
Além disso, companhias indianas estão investindo mais de US$ 8 bi e temos muitas empresas, incluindo players de óleo e transmissores de energia, visando investir no Brasil.
Fico feliz de informar que, hoje, as empresas indianas se tornaram parceiros cruciais nos projetos que estão sendo implementados pela Aneel.
5 – Qual é o posicionamento da Índia sobre a segurança energética global?
A Índia é o terceiro maior importador de óleo, com mais de 80% de sua demanda vindo de fora.
Projetamos um crescimento de 8% da nossa economia em 2022 e isso reflete diretamente em nossa demanda de energia.
Com o rápido crescimento da economia, esperamos ser impulsionador do crescimento da demanda de energia e petróleo até 2040.
O Brasil tem importantes reservas de óleo para dar suporte à Índia nesse crescimento e é de interesse mútuo que haja uma parceria longa em combustíveis tradicionais.
6 – O que a Índia tem feito quanto à transição energética?
Temos feito importantes progressos no que tange a transição energética. Hoje, a nossa energia renovável é o quarto mercado mais atrativo do mundo, estamos em quarto lugar em energia eólica, quinto em solar e quarto em energia renovável com capacidade instalada em 2020.
A capacidade de energia renovável instalada ganhou mais força nos últimos anos, registrando uma taxa de crescimento anual de 17,33% entre 2016 e 2020.
Com mais apoio do governo e melhora da economia, o setor se tornou muito mais atrativo para os investidores.
Em janeiro de 2022, a capacidade de energia renovável instalada da Índia chegou a 152.36 GW, representando 38.56% de toda a capacidade geral de energia.
975.60 MW da capacidade de energia renovável foi aumentada em janeiro de 2022. A geração de energia através das fontes de energia renovável registraram 13,15 bilhões de unidades (BU) em janeiro de 2022. Em janeiro de 2021, esse indicador foi de 11,51.
O país está mirando 450 GW de capacidade instalada de energia renovável até 2030 – cerca de 280 GW (mais de 60%) é esperado da energia solar.
A capacidade instalada de energia solar aumentou em 18 vezes, indo de 2.63 GW em março de 2014 para 49.3 GW no final de 2021.
A energia solar off-grid está crescendo muito rápido na Índia, com vendas de 329 mil produtos off-grid no primeiro semestre de 2021.
Com um potencial de capacidade de 363 GW e com políticas focadas em energias renováveis, a Índia espera ser um Hub de energias renováveis.
Eu estou muito feliz de dizer que a empresa brasileira WEG, por exemplo, está envolvida diretamente no mercado de energia eólica indiano e, recentemente, instalou um dos maiores parques eólicos na Índia.
Também estamos liderando a Aliança Internacional Solar (ISA), que possui 106 países signatários.
O principal objetivo da ISA é trabalhar pelo consumo eficiente da energia solar e reduzir a dependência de combustíveis fósseis.
7 – Como você vê a capacidade tecnológica e industrial do setor de energia brasileiro e como esse setor pode cooperar com a Índia?
Hoje, o Brasil tem o melhor mix de energia renovável comparado com as grandes economias, o que é realmente louvável.
Além disso, a experiência e os avanços brasileiros do etanol e flex-fuel são fenomenais.
Nós estamos cooperando com o governo brasileiro, setor privado, representantes como a UNICA e indústria automotiva para duplicar esse sucesso na Índia e aproveitar as inovações e experiências brasileiras.
Por outro lado, acreditamos que o Brasil também pode se beneficiar com a nossa experiência em desenvolver políticas para o mercado de energia renovável.
Como citado anteriormente, nós nos tornamos o país com um mercado mais atrativo do mundo em projetos de energias renováveis.
8 – Como é atualmente o desenvolvimento e capacidade industrial e tecnológica da Índia?
Nós já somos a terceira maior economia do mundo. Em termos de poder de compra, é estimado em US$ 11.75 tri.
Compartilhamos desafios similares aos do Brasil e também aspiramos alcançar um desenvolvimento socioeconômico em que todos os cidadãos possam fazer parte da história do crescimento do país.
Outro desafio que temos é a nossa limitação de recursos, por isso somos obrigados a encontrar ‘soluções caseiras’, em vez de importar soluções caras.
9 – Como você avalia a cooperação entre players do setor automotivo e da cana-de-açúcar dos dois países?
Nosso setor privado de cana-de-açúcar e automotivo estão cooperando para tornar o desenvolvimento sustentável uma realidade.
Durante a visita de Bento Albuquerque, os dois países concordaram em aumentar essa colaboração nessa área em 2G/3G de tecnologias em biocombustíveis, flex-fuel e escalonar a produção e o uso internacional de biocombustíveis.
10 – Há mais informação que gostaria de compartilhar?
O crescimento da Índia abriu muitas oportunidades tanto públicas como privadas. E isso tem sido reconhecido pelo mundo todo.
Exemplo disso foi quando assinamos o acordo de livre comércio com os Emirados Árabes Unidos, Austrália e Ilhas Maurício.
Concluímos também um acordo de livre comércio com o Reino unido e União Europeia recentemente.
Confira essa e outras matérias exclusivas na Edição 42 da revista Full Energy
- Premiação
Suresh Reddy, embaixador da Índia no Brasil, esteve presente no prêmio 100 Mais Influentes da Energia 2022, onde realizou um discurso de abertura e entregou parte dos troféus no palco.
Confira a premiação na íntegra aqui: