“O nosso compromisso com o metano”, por Eduarda Zoghbi

Apesar das discussões sobre mudança climática existirem há décadas, o foco principal sempre foi reduzir gases de efeito estufa, sendo o principal e maior contribuinte para o aquecimento global o dióxido de carbono (CO2).

Recentemente, passamos a escutar mais sobre o impacto que o metano (CH4) tem na nossa atmosfera por ser ele um gás oitenta vezes mais potente que o CO2.

O metano é o principal componente do gás natural, e hoje é responsável por quase um terço do aquecimento planetário.

Se não começarmos a priorizar a mitigação desse gás, as emissões de CH4 poderão alcançar um incremento de 13% até 2030.

A boa notícia é que controlar o metano é uma das maneiras mais fáceis e baratas para reduzir o impacto dos gases de efeito estufa na Terra.

O setor agropecuário é responsável por 32% das emissões globais de metano, seguido pelos setores de óleo e gás (23%), resíduos sólidos (20%) e carvão (12%).

A maior parte provém da criação de gado e de vazamentos de poços de petróleo. Portanto, controlar o metano significa investir em soluções que sirvam para a agropecuária, exploração de gás natural e controle de resíduos sólidos.

As empresas de óleo e gás deveriam ver o controle desses vazamentos como um incentivo para contribuir com a redução de emissões, dado que o metano liberado na atmosfera tem um custo para a empresa que perde parte de sua produção. A imagem abaixo nos mostra onde no mundo estão as maiores concentrações de metano:

Fonte: Carbon Mapper, último acesso: 11 de dezembro de 2023. https://data.carbonmapper.org/?plume_gas=CH4

Os cinco maiores produtores de metano são consecutivamente a China, Índia, Estados Unidos, Rússia e Brasil. Juntos representam metade das emissões globais de metano.

Tanto os EUA quanto o Brasil assinaram o compromisso global pela redução de emissão de gás metano em 30% até 2030 na COP26.

Mais de 110 países aderiram ao Global Methane Pledge, e de acordo com a Agência Internacional de Energia (IEA), se alcançarmos a meta desse compromisso, o balanço de emissões teria o mesmo efeito de anular completamente as emissões de CO2 do setor de transportes até 2050.

O think-tank americano, Rocky Mountain Institute (RMI), produziu um estudo mostrando que os vazamentos de metano podem a curto prazo prejudicar mais o clima do que o próprio carvão.

Embora o carvão supere o gás natural em emissões de CO2, o metano liberado durante a extração do gás natural pode equiparar-se às emissões líquidas de gases de efeito estufa do carvão. Um estudo recente descobriu que as emissões de gás podem até mesmo superar as do carvão.

O RMI criou uma calculadora que permite aos usuários estimar a equivalência entre gás e carvão com base na localização geográfica, levando a concluir que o gás natural não é necessariamente um combustível mais limpo devido ao metano associado à sua extração.

Medir a quantidade de metano na atmosfera não é difícil. O desafio é identificar de onde o gás está sendo emitido por ele permanecer menos tempo na atmosfera do que o dióxido de carbono.

A utilização de satélites tem sido determinante para mapear a concentração de metano na produção de óleo e gás, em refinarias, dutos, lixões e na produção agropecuária.

Entretanto, encontrar o vazamento ainda é um grande obstáculo, e por isso, muitas empresas ainda não monitoram suas emissões de metano e não as incluem em seus inventários de emissões.

Alguns vazamentos podem ser resolvidos de forma barata, com pequenas melhorias adotadas por empresas durante a produção.

Outros são não identificados através de satélites, especialmente em áreas encobertas por nuvens, florestas densas, áreas montanhosas, dentre outras condições naturais que limitam o uso tecnologias atuais.

Ainda não existe uma metodologia comum que empresas e governos utilizem para monitorar e registrar suas emissões de metano. Para especialistas, muitas vezes é difícil comparar dados e compromissos devido a falta de transparência e critérios universais.

O International Energy Forum (IEF) em parceria com a companhia Kayrros, desenvolveu uma metodologia compartilhada para medir e gerir o metano no âmbito de seus 72 países membros.

Mas ainda assim, informações incompletas de modo geral e falta de conscientização sobre os impactos do metano para o aquecimento global contribuem para que poucos países mantenham seus dados e metodologias de monitoramento atualizados dada a urgência para conter esse gás.

O metano no Brasil

O Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG) indica que o Brasil contribui diretamente com 5,5% das emissões globais de metano, sendo 72% provenientes da agropecuária e 16% do setor de resíduos (lixo e esgotos domésticos e industriais).

Em seguida, a queima de biomassa contribui com 9% das emissões de CH4, provenientes do desmatamento na Amazônia, que visa abrir cada vez mais espaço para o cultivo de lavouras e pastos.

O Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA) recomenda ações com base no estudo do SEEG que teriam impacto direto na redução brasileira de metano, além de trazer ganhos econômicos:

  1. Zerar o desmatamento
  2. Melhorar o manejo de dejetos de animais
  3. Eliminar a queima da palha de cana
  4. Aperfeiçoar a genética do rebanho bovino e terminação intensiva
  5. Erradicar lixões e garantir o acesso e universalização do saneamento básico
  6. Remover gradualmente resíduos em aterros com aproveitamento de biogás

Reconhecendo o papel central do Brasil em reduzir emissões de metano, organizações filantrópicas vêm anunciando doações para projetos nessa área.

O Bezos Earth Fund, criado pelo Jeff Bezos, anunciou durante a COP28 o investimento de 16,3 milhões de dólares no estado do Pará para alcançar o desmatamento ilegal zero e financiar dispositivos de rastreamento de metano via gado bovino, monitorando também outras cadeias de valor que contribuem para o desmatamento e a emissão de CH4.

A Bloomberg Philanthropies, do Mike Bloomberg, ex-prefeito de Nova Iorque, também durante a COP28 anunciou mais de 40 milhões de dólares para o rastreio de vazamentos de gás metano, com foco em trazer mais visibilidade e transparência no setor de óleo e gás.

Compromisso Internacional

Desde a COP26, o metano passou a ser reconhecido entre países-membros como uma prioridade através do Global Methane Pledge.

Durante a COP28, sediada em Dubai, mais de cinquenta empresas do setor de óleo e gás se comprometeram a reduzir dramaticamente suas emissões de metano até 2030. Dentre elas, grandes empresas estatais como a Saudi Aramco e a Petrobras, e outras internacionais como a Shell, Total e BP, fizeram parte deste compromisso.

Para apoiar a iniciativa, o Environmental Defense Fund (EDF) e a IEA irão trabalhar juntas para utilizar satélites e desenvolver medidas de accountability e transparência.

Além disso, seis dos maiores produtores globais de laticínios (Bel Group, Danone, General Mills, Kraft Heinz, Nestlé e Lactalis) também se comprometeram a disponibilizar dados sobre suas emissões de metano na agropecuária, formando um grupo que irá adotar um plano de ação para mitigar esse gás.

O mais importante é detectarmos imediatamente onde o metano está sendo produzido, e agir rapidamente para interromper vazamentos.

Segundo a IEA, dados sobre emissões de CH4 são essenciais para desenvolver políticas públicas, instrumentos de mercado e indicadores que possam ajudar na redução do seu impacto.

Para tanto, o monitoramento, a verificação e a publicação de dados por empresas e governos irão facilitar a validação de compromissos frente à normas nacionais e internacionais.

O metano deve ser um compromisso amplo e global, e sua eliminação trará benefícios para a saúde pública enquanto desacelera o aquecimento global.

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