Essa semana o setor energético comemorou o Dia Internacional do Biodiesel (10/08). Como já sabemos, o biodiesel – assim como os biocombustíveis de maneira geral – é extremamente importante para uma matriz energética mais sustentável.
O mercado de biodiesel teve início em 2005 e determinou a obrigatoriedade de percentuais de adição do biodiesel ao diesel, atingindo o percentual de 12%. Esse percentual aumentou, ao longo dos anos, chegando a 13%.
No entanto, em uma recente decisão parte do atual presidente Jair Bolsonaro, essa porcentagem reduziu, chegando novamente a 12%. A medida causou polêmica no setor energético e, inclusive, foi discutida durante o evento Energy Day, promovido pela Full Energy em maio deste ano.
A fim de esclarecer os pontos mais relevantes dessa discussão e também sobre o biodiesel no Brasil, a Full Energy conversou com Donizete Tokarski (Diretor superintendente da União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene – Ubrabio).
Essa semana foi comemorado o Dia Internacional do Biodiesel. O que o biodiesel trouxe, e ainda traz, de vantagem e benefício para o Brasil?
O uso do biodiesel tem diversas vantagens para o país. Incentiva a industrialização com o aproveitamento de óleos vegetais, como o de soja, gorduras animais e óleos residuais na matéria deste biocombustível. Hoje, as 50 usinas de biodiesel são distribuídas em todas as regiões do país, em 37 municípios em 14 estados gerando emprego e renda. Existem 12 outras sendo construídas.
Atualmente, o setor de biodiesel beneficia mais de 74 mil famílias da agricultura familiar que fornecem matéria-prima totalizando quase R$ 6 bilhões/ano. São mais de 300 mil pessoas envolvidas neste processo e que recebem assistência técnica, equipamentos e insumos da indústria de biodiesel.
Reduz a importação de diesel beneficiando as contas públicas. Cada litro de biodiesel produzido o país deixa de importar 1 litro de diesel fóssil.
O biodiesel também traz vantagens para o meio ambiente porque reduz em cerca de 80% as emissões de CO2 e outros poluentes e contribui para a descarbonização da economia como um todo.
Com menos poluição, o país registra menos doenças respiratórias, principalmente nos grandes centros, e consequentemente o número de mortes e internações hospitalares, com economia do gasto público.
Ao ser produzido, o biodiesel exige o esmagamento de soja, sua principal matéria-prima, para a obtenção do óleo. Com isto, eleva a oferta de farelo proteico que pode ser ofertado a preços mais baratos para rações animais. O reflexo disso é a redução no custo de produção de carnes, ovos e produtos lácteos beneficiando o consumidor final.
Explique de que forma o biodiesel pode se aprimorar?
Atualmente, a especificação do biodiesel brasileiro é uma das mais rigorosas do mundo. Apesar disso, a Ubrabio acredita que há como se tornar ainda mais rigorosa. Já solicitamos à ANP a revisão da especificação.
Mais do que isso, é necessária a custódia da qualidade de toda a cadeia seja do biodiesel puro, do diesel de petróleo e do diesel comercial que chega ao consumidor final após a mistura de ambos. Não adianta o produtor de biodiesel entregar um biodiesel Premium à distribuidora se esse cuidado não for aplicado em toda a cadeia de comercialização e permitir contaminação durante o transporte e manuseio após a saída da usina de biodiesel. Isso precisa e deve ser monitorado. Além disso, estamos apoiando o desenvolvimento de novas matérias-primas alternativas à soja, como a macaúba, e outras opções interessantes de aproveitamento da biodiversidade e potencialidades regionais que o país possui e estender o desenvolvimento de cadeias agrícolas de oleaginosas.
O que podemos esperar do mercado nacional nos próximos anos, considerando que o percentual de biodiesel no diesel comum diminuiu recentemente? A tendência não seria o contrário, aumentarmos esse percentual?
A legislação prevê a evolução, a cada ano, do percentual de mistura obrigatória do biodiesel no diesel fóssil. Desde março deste ano, o percentual de mistura deveria estar em 13%. Mas o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) reduziu para 10% alegando pressão das cotações das commodities e do câmbio que terminaram elevando o custo do biodiesel, mas, também, pela forte pressão de segmentos retrógrados contrários à ampliação do uso de biocombustíveis.
Pelo cronograma atual do CNPE, o B14 será iniciado em 01/03/2022 e o B15, em 01/03/2023.
A Ubrabio defende a construção de um novo marco regulatório que permita que toda a sociedade brasileira capte as externalidades socioeconômicas e ambientais que esse combustível renovável vem trazendo desde 2008. Portanto, a continuidade do incremento gradual da mistura, evoluindo a cada ano com 1 ponto percentual deve ser incentivada para alcançarmos o B16 em 2024 e, sucessivamente, até o B20, em 2028. Temos matéria-prima, tecnologia, mão de obra, capacidade de produção ociosa, usinas em construção e capacidade de ampliar investimentos produtivos interiorizando a industrialização e agregando valor às matérias-primas nacionais.
Não faz sentido o país continuar ampliando a dependência de importação de diesel fóssil, impactando a balança comercial brasileira e oferecendo à população um combustível que agride a saúde humana e o meio ambiente pela presença de compostos que emitem gases de feito estufa e outros poluentes, inclusive, cancerígenos.
Você comentou que a Ubrabio está organizando um evento sobre ESG. De que forma a Ubrabio aplica essa política e qual a importância disso?
A Ubrabio sempre reconheceu que o valor do biodiesel não deveria ser medido apenas pelo seu poder calorífico e custo de produção, mas, sim, por inúmeras externalidades exclusivas do biodiesel como menor pegada de carbono, redução do número de mortes e internações pela redução de emissões de particulados, interiorização e geração de renda e empregos no campo e na indústria, enfim, toda uma cadeia de sustentabilidade.
Não por acaso, desde sua fundação, em 2007, a Ubrabio vem aplicando critérios no estado da arte sobre governança corporativa. Mais recentemente, vem ampliando a interlocução com entidades nacionais e internacionais.
A II biodiesel week é um exemplo disso, pois trouxemos para o debate lideranças nesse tema que está na agenda da economia mundial, como representantes da Comissão Nacional de Bioeconomia do Conselho Federal da OAB, da Rede Brasil do Pacto Global da ONU, além da RSB (Roundtable on Sustainable Biomaterials), nossa associada.
Gostaria de acrescentar algum ponto relevante para a questão dos biocombustíveis e biodiesel?
Destacamos dois pontos: Em primeiro lugar, as gorduras animais, como o sebo bovino que é a segunda matéria-prima mais utilizada na produção de biodiesel. Somado às gorduras de porco, frango e peixe somam, anualmente, cerca de 750 mil toneladas/ano, que antes do advento do biodiesel eram descartados em “lixões”, passaram a ser transformados em biodiesel. No caso de óleo de fritura usado a produção de biodiesel absorve cerca de 100 milhões de litros/ano e tende a crescer tanto pelo incremento do uso do biodiesel quanto pela conscientização da população em geral na adequada destinação desse resíduo, mas que carece de uma política pública que alavanque o potencial ainda desperdiçado.
Destacamos, também, o RenovaBio, Política Pública que promove e reconhece o valor dos biocombustíveis está aderente à mudança de paradigma da sociedade para alcançar os objetivos mundiais no que se refere à manutenção da vida no planeta, além da viabilização dos compromissos globais de redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE) que o Brasil assumiu na COP21 (Paris, 2015).